Este é um texto de autoria de Fabrício Nunes, que retrata as memórias do passado que transformou o Kensai Eophain em um dos guerreiros de elite do reinado de Furyondy.
Texto Original: Fabrício Nunes
Revisão: Fabrício Nunes e Bruno de BritoVale muito a sua leitura!
15 de Sol Próspero de 586 CY
A medida que baixa os olhos, o guerreiro encara novamente o campo de batalha a sua frente. Os sons invadem seus ouvidos, trazendo-o de volta a realidade. Fechas voam como moscas sobre a carniça. Gritos, sons de luta e lamentos enchem seus ouvidos, se espalhando aos quatro ventos.
Eles estão presos num maldito cerco. O que aparentava ser uma vitória garantida sairá totalmente do controle, se transformando em uma emboscada. O inimigo estava em maior numero. Eophain e seus companheiros estavam ficando encurralados.
Seu pelotão estava dividido. A frente, alguns homens tentavam resistir a ataques inimigos cada vez mais ferozes em uma improvisada trincheira. Outros poucos espalhados em pontos diferentes. Atrás, guardando a única saída, estavam os demais soldados junto a seu capitão, resguardando a fuga para aqueles que os alcançavam. Entre eles estava Eophain, recém graduado guerreiro, ainda fresco nos sabores da batalha e pouco experimentado no calor do combate. Jovem, bravo e destemido soldado de Furyondy.
O combate era duro. O inimigo investia. Bons soldados tombavam ao lado de Eophain. Com aliados cansados e feridos, o guerreiro contava com a sorte e a benção dos Deuses no combate. Eles precisavam conter os ataques dos inimigos, deixando o caminho livre para a fuga de todos. Ali sua pericia em combate e sua espada eram de extrema necessidade. Em outros pontos da planície, demais soldados lutavam, matavam e morriam buscando a fuga, tentando uma retirada, em um combate feroz contra os inimigos mais ferozes ainda.
Lagrimas, sangue e suor se misturavam a lama. Gritos, fumaça e flechas inundavam o ar. O Caos reinava, hora a favor, hora contra as forças aliadas. Em determinado momento, o guerreiro Oerid observa seus aliados entrincheirados a frente tombarem. Jovens, amigos e companheiros de espadas morrendo, sangrando e fazendo preces aos deuses clamando por salvação. Eles estendem as mãos, suplicando auxilio. A imagem é insuportável. O ódio lhe queima. A raiva lhe impulsiona e, compelido pelo desejo de salvar seus amigos, Eophain avança. Salvar seus aliados ele deve.
Abandonado sua posição, sob os protestos de seu capitão, o guerreiro avança. Mutilando inimigos e ceifando vidas, ele avança. Ao ver seus amigos caindo um a um diante as lâminas inimigas, Eophain rompe a formação e quebra a retaguarda. Cego de ódio, embebido em sangue, ele avança. Sua investida as trincheiras somente lhe rendem um único aliado ainda vivo para salvar. Carregando-o nos ombros, em meio a flechas, lama e corpos, ele retorna a sua posição para encarar o preço de sua bravata.
“ – O que pensa esta fazendo, soldado?” – pergunta seu capitão por entre os dentes.
E sem esperar resposta, ele continua:
“O que você pensa que é? Quem lhe deu ordem de abandonar as defesas? Por acaso esqueceu que estava sob ordem de salvaguardar a retirada? Por acaso pensa que é algum herói?”
Atropelado pelo inquérito e ira de seu capitão, Eophain parece perdido. No afã de salvar seus amigos ele deixara as defesas desfalcadas de sua espada, tempo suficiente para uma investida das forças inimigas. Investida que, antes de ser contida, levou consigo preciosas vidas, preciosos soldados que não poderiam ser perdidos naquele momento. Ele quis salvara uma vida porem não avaliou o custo de sua imprudência. Um sentimento de impotência e desilusão invade o soldado Furyondês.
“- Veja o preço de seu heroísmo soldado. Braveja o capitão.
– Veja quantas vidas pereceram. E o que salvou? Um homem condenado!
Em seus pés, o guerreiro Oerid observa os últimos suspiros do fruto de seu resgate. Ferido mortalmente, o soldado salvo não resistiu aos ferimentos. Imediatamente Eophain é surpreendido. Agarrado pela gola de sua armadura, ele quase é erguido do chão pelo seu superior. O capitão o encara com raiva. Olhos nos olhos. Ele sente o odor de suor e o bafo quente que sai da boca do capitão e ali ele enxerga o preço de sua atitude.
“ – Vê agora, herói? Vê o preço que pagamos pelo seu altruísmo? Isto aqui é a guerra! Seu heroísmo condenou os poucos que ainda resistiam! Aqui na batalha não há lugar para heróis! Heróis existem apenas em contos para donzelas, soldado! Heróis são estúpidos em achar que podem salvar todos! Heróis são tolos, ingênuos e fracos! Aqui fazemos o que tem que ser feito! Aqui você só obedece! Não o que é certo nem o que é errado! SOLDADOS FAZEM O QUE TEM QUE SER FEITO!”
E com um empurrão, Eophain é arremessado contra o chão. Terra, lama e sangue espirram no rosto do guerreiro e encharcam sua face.
21 de Preparos de 597 CY (período atual)
Eophain desperta.
Acomodado precariamente, em um canto, numa das poucas construções que restou após o ataque, o guerreiro dormia. A chuva forte que caia lá fora romperá a palha do teto, molhando seu rosto e despertando-o de seu sono. Eophain já havia se acostumado com noites assim embora este pesadelo lhe fosse mais incomodo. Ele observa o recinto. Acuados e destruídos, os gnomos sobreviventes ao ataque tentavam em vão descansar. Em choque, os mais velhos velavam o sono dos mais novos. Um sono doloroso e penoso.
Seus aliados descansavam como podiam, espalhados dentro daquele casebre. O turno pertencia ao seu amigo Kalin, que em outro cômodo cuidava dos mais debilitados. Puxando seu manto o guerreiro levanta. Ele sabia que esta noite estaria perdida, pois o sono não lhe voltaria. Seu pesadelo trouxera um passado que lhe inquietava e, mesmo sob a chuva, ele sai. Uma chuva fria cujo o único proposito parecia ser extinguir o fogo que insistia em queimar algumas casas e lavar o sangue no chão.
Uma chacina ocorreu ali horas atrás. Caminhando pelos destroços de uma outrora vila já decadente, Eophain testemunhou essa atrocidade. Dizimada por gigantes, a força utilizada contra esses pobres gnomos foi desproporcional, injusta e desnecessária. No céu, a chuva da lugar a uma garoa, anunciando que em breve ira ceder lugar apenas ao vento frio da noite escura. No chão, jaziam os corpos dos gnomos que outrora viviam, mesmo com dificuldades, unidos e fieis aos seus pares. Em seu peito, um vazio toma seu coração. Tal qual aconteceu em seu pesadelo, enquanto ainda era um jovem soldado, o sentimento de impotência toma conta do guerreiro.
Um nó vem a garganta de Eophain. O que ele poderia ter feito para evitar aquilo? Teria tido ele oportunidade de minimizar toda aquela destruição? Se tivesse agido diferente, mais teriam sobrevivido? Quantos outros ele deixou de salvar ao longo de sua vida por ser apenas um soldado? Ele tinha feito o que fora ensinado a fazer mas agora lhe parecia pouco. Salvar mais pessoas lhe parecia o certo. Salvar a todos os possíveis é o que ele deveria ter feito. Herói é o que ele deveria ter sido.
O guerreiro tenta chorar, na esperança que as lagrimas lavem sua tristeza e preencham seu vazio. Porem, os longos anos entre a bigorna e o martelo da guerra haviam lhe roubado essa capacidade. No passado ele aprendeu a ser o que era. Frio, calculista e obediente. Eficiente e eficaz como um soldado devia ser. O exercito o moldou como argila em um ser vazio, dedicado apenas a fazer o que fosse ordenado a ser feito.
Aos seus pés, os corpos estendidos e sem vida clamavam por justiça. Entre os destroços, ele consegue encontrar uma pequena pá e uma enxada. Antes utilizadas para arar o pobre solo, seriam agora empregadas em um ato de respeito e solenidade. Um a um o guerreiro cava covas e enterra aqueles que pereceram. Um a um, lado a lado, numa tentativa solene de fazer algo certo. Numa tentativa desesperada de pedir perdão por ter feito tão pouco quando poderia ter feito além.
Os primeiros raios de sol rasgam o céu ainda escuro daquele dia. Olhando o céu, Eophain observa a noite resistir a luz que se espalha gradualmente, esticando seus feixes luminosos como tentáculos naquele mar de escuridão. Uma garoa leve cai e um vento gélido sopra, resquícios de um madrugada chuvosa que lavou uma noite triste e melancólica.
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