O bem e o mal, são conceitos quase palpáveis no universo da fantasia. Na realidade dos aventureiros esses substantivos definem uma posição moral e nunca antes o conceito e a realidade das palavras foram perspectivas tão cinzas…
Essa é a continuação da aventura O Caminho dos Heróis, divididos em 5 partes. Para ler o artigo anterior, clique aqui.
Essa é uma história original escrita por Bruno de Brito
Contribuição na revisão: Daniele Sotero
Sandy e Erzurel voltaram para o local onde confrontaram o ogro e os zumbis magos. Até ali não haviam notado que na direção oposta a que entraram, existia uma passagem. O portão duplo chamaram-lhes mais atenção, enfim lá estava a passagem. E foi Erzurel que falou:
– Sandy, não possuo mais magias, e o sol não completou seu ciclo, não possuo bênçãos e somente poderei ajudar com uma frente de combate. Não sou dos melhores, mas acho que posso ajudar.
– Meu amigo, tudo que precisamos é de força de vontade. Tê-lo ao meu lado nessa batalha, já me é valioso demais. Estamos juntos e juntos encontraremos o herdeiro do trono dos cavaleiros, vamos vencer. Tenhamos cuidado e lutemos com inteligência.
E com as palavras de motivação a dupla começou a seguir. E eles avançaram por um corredor que terminava em uma câmara. A passagem desembocava em um buraco cuja luz da tocha de Erzurel não alcançava o final do buraco. Não haviam escadas ou forma de descer seguramente, e ambos não possuíam corda ou arpéu. Erzurel encantou com o brilho de sua fé uma pequena pedra e a arremessou para medir a profundidade. A cerca de 20 metros de altura, uma água turva e com limos nos limites da superfície e paredes indicava o fim daquele poço. Não haviam outras passagens, apenas aquela, e seria por ela que eles iriam.
E quando o clérigo estava se preparando para traçar um plano para descer, a paladina saltou. Durante a queda Exórdios, sua armadura brilhou e recolheu ao medalhão. Sandy atingiu a água e afundou cerca de 3 metros até voltar a superfície. Sem luz ela nadou até uma borda em busca de apoio e a parede escorregadia impedia qualquer tipo de suporte e isso a preocupou. Gritando para Erzurel, ela disse:
– Erzurel, não há apoios aqui. Deve ter uma passagem no fundo. Vejo a luz da pedra que você encantou vou usá-la para ver se há passagens.
Erzurel| Sandy, cuidado. Pegue e volte a superfície. Procure pelo risco na parede que Lázarus comentou. Não arrisque seu fôlego. Como não há apoios, precisará de toda energia que possui. Enquanto isso termino de remover minha armadura. E cuidado! Lembre-se do Lázarus disse, aqui há um guardião, pelo amor de Pelor, cuidado!
E refletindo no peso que ela representaria, o sacerdote de Pelor teve que tomar uma difícil decisão. Remover a armadura e ter que deixa-la ali. O peso dela seria um ponto negativo lá embaixo e o puxaria para baixo se não tivesse força suficiente para manter-se na superfície.
Sandy | Certo Erzurel, terei cuidado.
A paladina exercitava a respiração para se preparar para o mergulho atrás da pedra luminosa de Erzurel. Havia um brilho opaco no fundo, deveria ser ela.
E assim ela imergiu, descendo rápido. Mergulhou descendo por cerca de 10 metros até alcançar o fundo, a água barrenta impedia uma visão clara das coisas, mas a luz estava lá e ela aproximou-se dela pegando no local onde havia caído. Quando chegou até a pedra notou uma grande criatura adiante. Era difícil discernir, mas o pânico a fez perder parte do ar armazenado, pegar a pedra e subir rapidamente. Um sentimento de desespero a tomou quando imaginou aquele ser prendendo sua perna e mantendo ali sem quase ar.
Sandy alcançou a superfície, e tomou uma grande quantidade de ar, seu coração batia acelerado, ao mesmo tempo que ouviu a água ser jogada para os lados com o salto de Erzurel.
Sandy | Erzurel! Tem algum tipo de criatura no fundo. Não pude ver claramente, mas possuía grandes tentáculos, se prepare meu amigo.
Erzurel se debatia na água para encontrar o equilíbrio necessário para segurar sua arma com uma mão e manter-se na superfície com a outra em conjunto com as pernas. Aquela tarefa era desesperadora difícil. Natação nunca fora seu forte.
Sandy notou a tentativa desesperada de Erzurel se manter na água, e percebeu que seu companheiro logo se afogaria se continuasse daquela forma.
Sandy | Erzurel, guarde sua arma e nade para a parede, tente achar algum apoio, alguma irregularidade na parede, vá!
Erzurel ouviu a paladina e desajeitadamente nadou até a parede. Quase perdeu sua arma na tentativa de guardá-la. Aquilo era um tremendo desafio ao sacerdote. Logo a criatura iria atacar e imaginar um combate ali era desesperador. Ele nadou até a parede e tateando acabou encontrando uma área onde poderia se manter com apenas uma das mãos preso. Ele estava beirando o pânico. Já tinha bebido duas vezes aquela água enquanto se debatia para manter-se na superfície.
Sandy estava com Exórdios na mão em forma de espada e equilibrava-se com a outra mão fechada segurando a pedra luminosa de Erzurel. Ela aguardava o ataque, e ele não veio. Havia algo estranho ali. Passaram segundos que foram uma eternidade e nada da criatura. Alguma coisa estava errada.
Sandy | Erzurel, você está firme aí?
Erzurel | Sim Sandy, estou bem. Cadê a criatura?
Sandy | Eu preciso investigar. Há alguma coisa estranha aqui. Você sentiu um gosto estranho na água?
Erzurel | Como? Sandy isso aqui é esgoto, como vou discernir algum sabor em nome de Pelor!?
Sandy | Fique aí, invoque uma luz, se conseguir. Vou descer.
Erzurel | Sandy… Cuidado minha amiga, infelizmente sou péssimo nadador…
Sandy exibiu um sorriso em direção a Erzurel, esperando que ele não tivesse notado e disse:
Sandy | Fique aí, volto logo.
A escuridão tomou o buraco a medida que a luz embasava na escuridão virando apenas uma mancha luminosa. Erzurel não tinha condições de invocar os poderes de sua fé. Estava com medo, verdadeiramente estava com medo, conhecia ali algo que temia verdadeiramente. Em seus pensamentos esperava que a fera estivesse adormecida e pudessem passar sem despertar-lhes o interesse. Ao mesmo tempo estava preocupado com a paladina, de onde aquela mulher tirava tanta coragem, e pensava como a ajudaria? Seria muito difícil.
Enquanto isso Sandy descia. Exórdios vestiu Sandy com uma malha extremamente leve e seus cotovelos, pés e mãos estendeu suas partes metálicas aprimorando a capacidade de nado da paladina, no lugar da espada, longas garras conectadas por finas membranas de um metal facilitava o nado da paladina. A armadura sagrada havia lhe revelado um novo poder. A capacidade de se adaptar e se tornar preparada para proteger mesmo em condições como aquela. Era uma verdadeira benção de Heironeous.
Sandy desceu até onde esperava se deparar com a criatura e não demorou muito para encontrar. O ser estava aninhado em meio a seus tentáculos no fundo da câmara. Ali Sandy iluminou bem próximo e viu que uma seiva grossa e verde vertia de ferimentos no grande polvo. O ser estava morto. A paladina não se aproximou o suficiente para testar sua teoria, mas deduziu que ali não havia uma ameaça. Ela aproveitou um pouco mais de seu fôlego e sua capacidade de deslocamento que agora havia se ampliado por conta da forma de Exórdios e percorreu a laterão daquela área, encontrando em um ponto uma passagem. Era hora de voltar.
Erzurel já estava considerando tentar invocar suas preces e trazer luz aquele local. Quando uma luz foi ficando cada vez mais forte vindo do fundo e emergiu com sua companheira. Erzurel não sabia porque, mas naquela situação insólita sentiu fome e lembrou de quando foi sua última refeição. Pensou em suas rações na mochila a sua costa e imaginou-a empapada com aquela água podre e suja. Estava tudo condenado, e seu estômago reclamava. Se pegou tendo esses pensamentos e imaginou porque estava tendo-os exatamente naquela hora…
Sandy | Há uma criatura aparentemente morta no fundo dessa câmara. Encontrei uma passagem também do lado oposto ao que está o ser. Você vai precisar mergulhar meu amigo. Venha, irei lhe ajudar mas precisará manter a calma, ou nós dois iremos nos afogar, certo?
Erzurel | Certo companheira. Agora me diga uma coisa. E se essa for a única saída. Como sairemos daqui com o príncipe?
Sandy | Erzurel, um problema de cada vez. Se tivermos mesmo que voltar por aqui, vamos observar nosso caminho a frente e já ir pensando em algo que possa nos ajudar em uma escalada em uma superfície tão lisa, agora vamos, não temos tempo a perder.
Erzurel e Sandy tomaram grande fôlego e ambos mergulharam. Sandy foi ajudando da melhor forma Erzurel. Não havia muito o que fazer, aparentemente para o sacerdote, afundar era uma tarefa fácil. Ele foi seguindo Sandy e sua luz e avançaram pelo corredor submerso.
Erzurel foi avançando e em sua mente um pensamento de distância, fôlego, mais desespero começou a se formar. Estavam avançando muito e até ali não havia sinal de zona respirável. O sacerdote sabia que precisava manter a calma. O pânico ali embaixo seria sua morte e da paladina. Parou por um momento muito breve e pensou em um verso de Pelor. Aquilo lhe trouxe uma tranquilidade tão preciosa quanto um “gole” de ar e ele avançou. Estava se distanciando da paladina.
Sandy avançava preocupada, Erzurel nadava mal e gastava muita energia com movimentos desnecessários, mas vinha determinado. Em sua mente Exórdios lhe sugeria o rápido avanço em busca de um porto seguro, de uma área respirável, mas se afastar de Erzurel poderia o fim do sacerdote, e ela se manteve próxima. O caminho se prolongava interminavelmente o teto era completamente imerso, sem bolsas de ar. Em seu íntimo uma dúvida começava a correr. Ela não buscou os sinais alertados por Lázarus antes de tomar a passagem. E se houvesse outra passagem e aquela levasse para lugar nenhum? Havia condenado a ela e a Erzurel. Com isso ela decidiu avançar, deixando Erzurel mais para trás.
Erzurel viu a paladina cada vez se afastar mais, e entendeu o movimento da companheira. Ela precisava encontrar uma área respirável, eles já haviam avançado muito e nada de encontrar a superfície. A luz foi deixando o local, acompanhando Sandy e a frente e agora era apenas um borrão.
O ar chegou ao fim, e um incômodo intenso abateu o sacerdote. Ele tateou o teto daquele local e nada. O desespero avançou rapidamente. Erzurel tentou respirar e a água invadiu os pulmões. Ele estava morrendo. As últimas bolhas de ar saíram de suas narinas e seus olhos vítreos observaram a escuridão. Ele apenas lamentava morrer na escuridão.
Sandy avançou, a paladina já havia concluído que deveria ter avançado sozinha. Ter vindo com Erzurel havia sido um erro e grande risco a vida de seu companheiro, mas deixa-lo na outra câmara também era arriscado. Ela não tinha certeza de que o polvo estava morto ou apenas recluso nas profundezas da câmara, fosse como fosse, precisava desesperadamente encontrar ar. E conseguiu ao chegar até uma área maior, indo imediatamente para cima. Quando chegou a superfície encontrou ar e arfou plenamente o ar valioso. Tinha chegado até o limite de sua capacidade.
Sua intuição a alertara para o perigo, havia se passado frações de segundos sem sinal de Erzurel e ela quase sem tomar fôlego algum mergulhou novamente. Sandy nadava com uma maestria incrível. Exórdios otimizava cada movimento e força impelida para ir para frente e o coração de Sandy batia acelerado. Ela viu no corredor o corpo inerte de seu companheiro. Ela o agarrou e iniciou o caminho até a área que houvera descoberto. Suas lágrimas se misturavam a água suja, havia se passado um tempo precioso, ela não sabia se Erzurel…
Os pensamentos da paladina foram interrompidos com seu retorno a superfície e a necessidade urgente de prestar ao companheiro os primeiros socorros. Ela precisava retirar a água de seus pulmões. Imediatamente começou a pressionar o seu externo e a cada três pressões ela tapava a narina do sacerdote e soprava-lhes ar.
Nada. Erzurel não reagia. Houvera ingerido uma quantidade muito grande de água. Sandy começou a chorar e bater já sem ritmo no peito do sacerdote, sem sinais de que voltaria. Erzurel estava morto.
Sandy chorava copiosamente. Sentada com a cabeça do sacerdote em seu colo ela chorava, não havia culpa, só havia dor. Ela não sabe quanto tempo havia se passado, mas sabia que precisava seguir, seu dever a chamava, ela não podia fracassar, por Erzurel, ela precisava continuar.
A paladina tirou da margem o corpo de seu amigo, trazendo-o para uma área seca, aninhou seus braços cruzando-os no peito, uniu suas pernas e depositou entre os dedos a pedra luminosa, como um amuleto de proteção, em meio àquela escuridão.
– Eu voltarei meu amigo. Seu túmulo não será essa câmara fria.
Continua em: O Guardião